A Vida e a Sardinha
Pego o prato, abro a lata de sardinhas, com um garfo tiro os dois pedaços de peixe e despejo o molho em cima. Empurro o prato para o freguês, parando do lado do copo de cerveja. Jogo a lata fora enquanto ele corta um pedaço com o garfo. Então o come. Pego o pano e vou esfregando o balcão.
Ele me diz enquanto parte mais um pedaço:
— Acho impressionante a semelhança que temos com essas sardinhas.
— Semelhança? Que semelhança?
— Nascemos para ser livres. Mas isso funciona só na teoria. Sempre há alguma coisa. Alguma intervenção.
— As sardinhas são pescadas.
— E nós nos prendemos ao trabalho, família, problemas. Nós vivemos apertados em nossas próprias latas chamada vida e não temos escolha nenhuma até alguém nos tirar da lata. E geralmente quando isso acontece, nós estamos mortos.
— Faz sentido.
— Sim. E vivemos tanto tempo nessa lata que já estamos acostumados. Ninguém consegue imaginar como seria a vida no mar aberto.
— Ou na total liberdade.
— Exato. E é assustador pensar em como essa liberdade seria. — Dito isso, ele come o último pedaço de peixe. — Mas há uma diferença entre nós.
— E qual é?
— Sardinhas são muito mais saborosas.
Balanço a cabeça. Eu concordo.