Background

Para Onde Ir


— A minha vida estava indo para algum lugar. — Eu digo.

    Estou sentada em um banco próximo ao balcão, daqueles em que raramente as pernas das pessoas servem e precisam ficar de lado, por essa razão aproveitam para trocar olhares entre o resto do bar e a bebida. É isso o que faço. O dono do bar me deu uma pinga de graça porque eu cheguei dizendo que não há nenhum sinal bom que me diga que algo vai dar certo. Ele disse que esse poderia ser um sinal.

— Mas eu comecei a fazer tudo errado. Sabe qual foi a última vez que estive sóbria? Vá, adivinhe.  Eu digo, mas não deixo tempo para ele dar um palpite. — Mês de agosto dos meus dezesseis anos. Desde então eu só tenho feito merda fora de consciência e todos me perguntam onde eu quero chegar com isso. Diga, em que inferno eu posso chegar com isso?

— Em qualquer lugar. Aqui. Lá. Tanto faz, isso é relativo. Você diz que fez tudo errado e sabe o que eu te digo? Que você apenas fez o que deveria. Todos pensamos em mil coisas que queremos fazer e alguns de nós até luta para consegui-las. Mas a grande maioria nunca chega ao fim, ao estágio de alcançá-las. Sempre somos desviados por qualquer coisa e nos contentamos com o que fazemos. Comodismo. Chegar a algum lugar é apenas ponto de vista, porque sempre chegamos a algum lugar. Seja ele bom ou ruim. A eterna busca pela felicidade se resume a isso. A um copo vazio.

— Enche mais um, por favor, esse eu pago.  Eu peço, mas ainda está passando um filme na minha mente, começou quando ele disse que fiz o que deveria. – Olha, se eu pudesse repensar o que fiz uns minutos antes de fazer, não chamaria de dever. Dever não fode ninguém tanto quanto andei me fodendo, dever é uma coisa certa, sabe? Eu não tenho objetivo de chegar a lugar algum, mas eu sei que não quero continuar aqui. Eu cansei dessa vidinha de beco e bar, me desculpa.

— Então parece que eu perdi uma cliente. — Ele ri. — Talvez pensar antes de fazer nem sempre seja a coisa certa. Pensar cria expectativas. E expectativas nunca levam a lugar algum. Você acha que na minha infância eu desejava ser dono de um bar? Eu tinha expectativas de um outro futuro. Um futuro inalcançável. E agora estou aqui, fazendo apenas o que eu devo, sem pensar sobre. Servindo uma bebida para você. Arrastando pessoas para fora do bar. Evitando uma vez ou outra uma briga. Talvez o fato de você não ter um objetivo seja sua salvação. Um impulso inconsciente de fazer o que deve e não o que pensa. Vá para onde desejar, arranje um futuro diferente. Mas não pense nele, não crie expectativas. Ou continue aqui e termine essa bebida. Como um dever. 

— Eu sabia que essa pinga grátis ia sair mais cara que as que eu pago.  Resmungo. Ele ri outra vez, ele sabe que está certo. — Você manipulou a porra toda, me deu esse tal “impulso inconsciente” para continuar aqui e sabe o que vou fazer? Isso mesmo! Hoje, amanhã, eu devo te atormentar sempre, doninho de bar. – Continuo dizendo em um tom que mistura ofensa e agradecimento, convenhamos, ele me deu alguma força e esse é meu jeito de dizer que ainda sou uma cliente e uma vivente nesse mundo.

— Então você está planejando um futuro no meu bar? Criando expectativas sobre permanecer aqui? Ou está simplesmente seguindo seu impulso inconsciente, o seu verdadeiro eu? Que seja, reflita sobre isso, eu também vou. Tome mais uma bebida. Acho que eu devo te dar essa.

Onde e quem: , , Compartilhe

Leave a Reply