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Traída

     Ela rodava com o dedo na borda do copo vazio. Pego a vodca, encho seu copo. Sim, ela está bebendo vodca. Ela está bebendo para ficar embriagada rapidamente.
     Antes de guardar a garrafa, porém, ela segura meu pulso e me encara. Seus olhos azuis são grandes. E brilhantes.
     — O que você acha de mim? — Ela me pergunta. Eu franzo a testa. — Você me acha bonita? E não falo somente aos olhos de Deus. Quero saber aos seus olhos.
     Eu rio.
     — Você é bonita sim. Olhos azuis, cabelos castanhos. É o tipo de beleza que os homens procuram.
     — Então por que você acha que ele me traiu?
     Ah, então é isso. Recosto no balcão. Parece que alguém precisa conversar.
     — Porque ele podia.
     — Como assim?
     — As pessoas costumam fazer as coisas simplesmente porque podem. Com o homem é mais fácil, mas isso não quer dizer que com as mulheres não seja igual. Podemos ter um relacionamento sério, mas se surgir a oportunidade de fazer alguma coisa com outro alguém, essa chance será aproveitada. Talvez porque o próximo seja mais interessante. Ou faça mais coisas. Ou só sirva para se colocar em perigo e aumentar a contagem. Não interessa. Ainda somos animais em busca do que comer. A diferença é que somos evoluídos e criamos uma série de regras em cima disso. Até mesmo o alimento mudou.
     — Aquele filho da puta… aquela puta… você acredita que ele comeu ela na cama que dividimos há um ano? Um ano!
     — Um ano de casado?
     — Sim. E ele agora me fez isso. Se fosse para me trair, nem casasse.
     — Acontece que ele não sabia que esse tipo de coisa poderia acontecer. Sabe, a oportunidade surgiu mais tarde. Como uma boa pessoa, você acha que ele deixaria isso passar? Ele não está errado. Só desobedeceu uma das regras impostas pelo homem para segurar seus próprios instintos.
     — Então você considera a traição algo bom?
     — Não. Considero a traição algo humano e muitas das vezes inevitável. Claro que podemos segurar nossos impulsos. Não vemos muitas pessoas por aí matando ou estuprando ou brigando à toa. É um impulso que sim, precisa ser segurado. Mas é um impulso e por isso não é algo execrável.
     — Então você acha que estou fazendo esse showzinho à toa?
     — Também não. Você é um ser humano também e merece se sentir ferida. O que você não merece é abaixar a cabeça e deixar algo do tipo passar. Aceitar o pedido de desculpas dele. A traição física em si não é algo execrável, mas a traição na confiança o é.
     — E o que você sugere?
     — Divorcie. Pague na mesma moeda. Sei lá.
     — Pagar na mesma moeda? Sim… quero ver como ele reagirá diante disso. Como ele se sentirá depois que for traído. Depois que descobrir que sua esposa está dando pra outro.
     — Ele vai se sentir traído. Talvez queira se divorciar. E você estará por cima. Você só o fez porque ele a traiu. Traia-o e ele vai saber que você não é mulher de se prender. Traia-o com alguém menor, socialmente falando, e ele vai perceber que não é o suficiente para você. E se sentir diminuído. Traia-o com alguém mais sagaz e ele vai se sentir fraco, ruim de cama, um péssimo amante; seu orgulho sairá ferido.
     — E quem você sugere para isso?
     — Quem? Eu mesmo, ora.

     Ela sorri. Hoje o bar vai fechar mais cedo. 

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